11.8.09

O céu entre os muros...

Encerrar determinados capítulos na minha vida dá-me sempre uma sensação de vazio... mas daquele vazio que precede uma renovação! Um vazio de esperança e de futuro! E neste Agosto quente e temperamental é assim que me sinto...

Também nestas fases o filme da minha vida tem daquelas cenas em que aparecem grande planos a preto e branco, ou a sépia... flashback de memórias, imagens e momentos de que há muito não me lembrava mas que, sem saber explicar porquê, involuntariamente recordo.

Basta uma centelha para fazer reavivar o fogo fátuo das recordações... é quase estúpido escrever sobre isto porque o encadeamento lógico é impossível: o acontecimento recente que reavivou a recordação não podia ser mais distinto desta!

Há uns anos atrás (dez?), na Secundária que frequentei, passava uma tarde livre no bar da escola, de cuja janela se avistava o Cristo Rei! Era uma sexta-feira! Sem me conseguir concentrar nos pormenores, recordo nitidamente o meu (mau) humor (porque é um estado raro), e os amigos que me faziam companhia e cujas tentativas de me animar e fazer rir resultavam infrutíferas...

Chamemos-lhe Tiago... depois de muitas das piadas que resultaram vãs, perguntou-me porque estava tão em baixo. "Não sei!"Perguntou-me o que olhava tão fixamente... "O Cristo Rei"... mais para que me deixasse em paz do que pela vontade de responder. Ouvi as palavras que trocou com, chamemos-lhe Bruno, quase tão silenciosas como um olhar cúmplice.

Quando dei por mim estava atrelada aos dois, um em cada mão, e sendo arrastada, pela porta do bar da escola em direcção ao portão da dita!

"Onde vamos???"

"Bora! Deixa-te de merdas!" - disse um.

"Vamos ao Cristo Rei!" - disse o outro.

"Agora estás cá em baixo a olhar lá para cima. Daqui a bocado vais estar lá em cima a olhar cá para baixo..."

Ri-me, convencida, pela ironia da fórmula que arranjavam para fazer face ao meu estado de espírito!

Foi com pressa que tentámos lá chegar... a correr e a rir que nem parvos pelo caminho! Como se o Cristo que olha Lisboa, fosse de repente fugir. Tal era o entusiasmo que só quando lá chegámos nos lembrámos que a subida lá acima era paga! Entre todos, tínhamos dinheiro à justa para dois bilhetes para o elevador... e tal era o nosso entusiasmo e o nosso ar adolescente de que "a nossa felicidade futura depende de subirmos os três agora até ao cimo do Cristo Rei" que, sem ser necessário dar grande explicações, o senhor nos deixou passar aos três com dois bilhetes.

É incrivel o espectro de emoções que um adolescente consegue experimentar tão intensamente no mesmo dia... mas uma vez lá em cima sentimo-nos felizes, rimo-nos daquela forma que só as coisas mais espontâneas nos conseguem fazer rir, emocionámo-nos e eu realmente olhei a escola lá em baixo onde uma hora antes me encontrava com um humor de cão, mirando o Cristo Rei no horizonte.

Abraçámo-nos! Descemos! E quando chegamos cá abaixo e começamos e fazer o caminho de volta, descendo as ruas estreitas que ligam o Cristo Rei a Almada, Bruno, que tinha pinta de filósofo, diz, quase entredentes... "E depois de termos tocado nas nuvens, apercebemo-nos que a nossa vida está rodeada de muros!" Parámos e olhámo-lo incrédulos com o sentido que aquela frase fazia... Estávamos naquela fase ainda um pouco desajeitada, em que as coisas mais profundas eram saudadas com risadas e palmadas nas costas... mas havia um silêncio cúmplice e um sorriso nos lábios de cada um ao regressarmos, à pressa também, porque seria já perto da hora de jantar e bem mais tarde que a nossa hora de saída da escola!

E ainda hoje penso na metáfora da vida que foi esse dia da minha adolescência... Por muitos altos que sejam os muros, há sempre qualquer forma, nalgum momento, de tocar o céu, e de algum ponto mais alto perceber quão altos (ou não) são esses "muros" que nos cercam!

Descrever agora o acontecimento actual que despoletou esta memória era um anti-climax para a minha história... fica para outro dia!

Posso apenas revelar que envolve dois muros altos (duas semanas intensas a nível de trabalho e a nível pessoal) e a oportunidade de vislumbrar desta vista entre ambos!



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